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01 março 2006

O Grito


Devagarinho resvalo nas linhas estreitas da vida. Por vezes corro e caio fora delas. Sacudo os sofrimentos, tento guardar as alegrias. Continuo devagarinho no resvalo e agarro-me com mais força, mas a vida sacode-me. Estatelo-me amiúde em sítios desconhecidos. Aventuro-me sempre, escorrego, equilibro-me... lá vou eu.

Imagino que nem tudo tenha significado, por isso protesto, mas aguento. Sou uma mulher que faz das fraquezas forças. Fecho os olhos e sonho, aperto em desespero as mãos e sofro. O desalento surge vindo não sei de onde e a voz, que sinto minha, grita a vida que ainda tenho. Contra ventos de desventura luto, nunca me entrego. “Jamais!” – digo, cada vez mais baixinho, mas SEMPRE digo!

O espanto não me abandona e, junto com o medo que transporta, amarfanha-me a alma. Alma que tem um coração que bate forte, não desiste de bater e nos olhos se retrata em forma de fonte de água que quero secar, mas não seco. Na dor que sinto bem fundo e me faz dobrar em duas, agarro o meu físico e sinto-me. Obrigo a voz a sair forte... mais forte... ainda mais forte, mas não consigo expulsar estes tormentos que se cravam que nem garras nas pregas da minha existência. Cerro forte os olhos e a boca e um turbilhão de sentimentos afloram batendo uns nos outros, misturam-se no negro que vislumbro, acumulam-se numa bola gigante e ameaçam rebentar-me as têmporas se não os respiro. Abro então a boca e deixo-os sair em catadupa. O alívio que deveria sentir revela-se no amansar das emoções, mas algo os impede de me abandonar, apenas me deixam descansar um pouco em período de tréguas.

O simples complica-se e o complicado deixa de fazer sentido. Me resumo a mais um ser... mais um ser! Que queria eu?

Deixar de pensar, deixar de sentir. Ser árvore, ser Sol, ser chuva, ser mar...

DEIXEM-ME EM PAZ! Grito ainda, mas só eu me oiço.