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06 março 2011

Estranha Forma de Ser


Ali estavam os dois, lado a lado, sós, em diálogo surdo, com a fala a sair aos tropeções, num som exaltado e ausente, entre a agressividade e o desespero, som estranho, mesmo para quem o proferia.

Só o pensamento, descodificado e impune, impunha a sua presença, em ruídos de acusações estéreis.

Sempre aquele nó cego a fazer doer os neurónios da compreensão e a debilitar as forças que saíam em gotas de suor, alertando para mais uma crise onde vencer era uma acção desconhecida.

E o voo da felicidade a sentir-se perdido, desorientado, com asas de desconfiança, inseguras.

Fazia falta algo, uma paragem talvez, mas… como se pára o que não se entende? Como se acalma o desejo da mudança? Como se alteram os pesadelos?

Que palavra faltaria usar?

Ah a invenção a abandonar a racionalidade, a racionalidade a mascarar-se de ilusões e estas a magoarem o âmago do entendível.

Outros olhos, não os redondinhos inquiridores, mas os da alma, os do vazio intenso, alojados sabe-se lá onde, queriam ver para sentir, mas a cegueira do desespero obrigava-os a fechar-se, colocando-os no esquecimento, no abandalho de vida que se alojava aos poucos, virótica e resistente, votando-os aos esquecimento do que ainda não acontecera.

Por onde parariam as estrelinhas da importância? O perfume da sedução? O encanto da descoberta? A leveza? A aventura?

E as teimosas palavras surdas a saírem em boomerangue, a transformarem-se em setas, a estilhaçar o próprio coração.

Seriam eles aquilo?, só aquilo?

Não!, mas para já, servia-lhes bem a esgrima sangrenta da ausência de palavras; a insanidade da culpa isolada; o medo da solidão sob vestes de carrascos de grilhetas inventadas, ou moribundos amorosos, em decomposição, lenta, sofrida, quase sado-masoquista.

E no vício inconsciente da autodestruição, o bambolear desajeitado de uma forma de vida em gritaria de soberba solidão, quase maravilhosa, nostálgica e triste, com sardas de alegria e deportada vontade de ser.