Vi
um filme, porque hoje é domingo, não trabalho. Sentei-me no sofá, pernas
estendidas, almoçadeira cheia de leite e água e café e açúcar, em doses
ocasionais – sempre certas. Várias
fatias de pão com doce, acompanharam o desenrolar do filme que, já vi em tempos
e até tenho na estante da sala.
Grotesco
não me lembrar de um filme assim. Deve ser da idade (a avançar mais rapidamente
do que alguma vez imaginei), falha-me a memória.
E
dei comigo a encolher as pernas, a abraçar a cintura e a chorar, que nem uma
desalmada: a não me importar se algum resto de rimmel esborratava as minhas
olheiras.
Porra!
Ultimamente
está mais refinado o meu sentir.
Ao
perceber que a máquina de lavar roupa terminava a sua função, fiz pausa para a
estender.
Debruçada
nos ferros pintalgados de ferrugem, vi o meu quintal. Corri o olhar em redor e
senti que viajo muito, que descubro pequeninas coisas - e como eu gosto de descobrir pequeninas
coisas.
E
senti os olhos brilhar de felicidades várias.
Foi
exactamente nessa altura que me lembrei de um soneto de Camões sobre o amor e
me apeteceu roubar um verso:
“é
um andar solitário entre as gentes”.
Porque
esse verso define muito de mim. Entra pelo meu sótão e embala-me as memórias, à
laia de quem se despede, mas fica sempre.
E eu
permito, porque vou doseando a solidão com a vontade de viver e a esperança de
um dia o esquecimento ser maior que a própria dor:
incapaz
de ultrapassar as minhas pequeninas – mas tantas - felicidades.
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