Páginas

14 maio 2007

Em Pinturas




Foto: minha autoria





Existem dores difíceis de apagar ou minorar, porque confusas. Porque será que neste choro tenho a tendência de levar as mãos ao rosto e de apertar as pálpebras com força e de retesar os músculos faciais, enquanto um som qualquer se acumula na garganta, empurrado pelo encolher de barriga e estômago? Foi um pequeno aparte, possivelmente todos fazem isso, depois há muitas formas de chorar. A esta forma chamarei o choro surpresa, porque só dou conta dele quando as mãos lutam ou aparam minhas faces.

O choro surpresa vem junto com a tal dor difícil de evitar. Vem cheio de confusão, abre portas de descobertas, mas descobertas não sustentáveis, daí a confusão. Faz-se sentir quando percebo que algo pode não ser o que parece, pior, algo pode não ser o que tentam que pareça. As minhas quase descobertas sempre são feitas tarde e más horas, quando já não necessárias e nunca despoletadas por mim. Daí o reabrir de feridas que sarei rápido porque julgadas entendidas.

Não sou de meias medidas e, se aos olhos de quem leia meus textos, sem me conhecer, possa parecer uma pessoa triste, depressiva, caótica, destrambelhada. Afirmo que tenho uma dose qb disso tudo, mas - ESPANTEM-SE – sou alegre. Só não consigo suster estes choros porque a tal dor abre mágoas e perguntas desagradáveis. Perguntas a que respondo infantilmente, o que me magoa ainda mais. Perguntas que surgem de chofre, quando tudo parece explicado, qual terramoto cheio de réplicas, em dia bonito.

Sou uma saloia simples. A minha alegria existe nessa simplicidades, contrasta com esses choros que me abanam todinha e quase fazem ruir o brilho de meu olhar. Esse choro provoca raiva, revolta, porque enquanto reconstruo tijolo a tijolo toda a minha pessoa verifico que alguns tijolos vão lascados e isso chateia-me.

Não choro por amores falhados, esses apenas lamento e esqueço. Choro porque me sinto um osso mal roído, mas não esquecido.

Estou magoada, revoltada, em raiva surda de ser tão estúpida. Ofereço-me sem reservas e esbofeteiam a minha docilidade e credulidade, pior abrem a porta dos meus porquês e soltam o ser ou não ser. Destroem imagens belas, transformam-nas em horror e quase me afogam por entre limos de monstros negros que teimam passar as mãos sujas em meu rosto espantado. Assisto, em choque, a transformações não imaginadas e o cinzento e negro aumentam por entre um plasma sujo e oleoso onde os monstros tentam sorrir enganos e me fazem vacilar em pena e desgosto, enquanto tento pegar seus rostos e neles fazer retoques a cores lindas de primavera.

Tudo em vão! Nada se entende e acabo por chorar lágrima multicolores, quais diamantes polidos que contrastam com o negro da desilusão. São diamantes cheios de dor e de esperança. Dor pelas descobertas, esperança de manter o brilho das cores de que sou construída. Cores quentes, alegres, aveludadas e simples, cheias de margaridas, rosas e cheiros bons, por onde dançam notas de música suave e linda que transportam o meu sorriso.

Há, sem dúvida, dores difíceis de apagar ou minorar, mas mais difícil é apagar páginas da nossa vida que julgámos belas.

1 comentário:

Fio de Beque disse...

obrigado por essa musica, fizeste com que fosse desencantar uns vinis desse tipo lá em casa... um dos meus guitarristas favoritos ;)